tag:blogger.com,1999:blog-20611853789597493912024-03-13T08:41:59.957-07:00Estudos SociaisDesejo, por meio deste, publicar idéias próprias e de autores clássicos e relevantes, com a intenção de explicá-los e torná-los mais conhecidos e acessíveis àqueles que desejarem. Aqui serão publicados não apenas ensaios jurídicos, mas também políticos, sociais, filosóficos e econômicos.R. Bisellihttp://www.blogger.com/profile/12507304467117974588noreply@blogger.comBlogger3125tag:blogger.com,1999:blog-2061185378959749391.post-70573274971812357812008-11-29T21:44:00.001-08:002008-12-01T02:37:14.381-08:00O novo paradigma: O Judiciário e a PolíticaNeste ensaio pretendemos analisar as transformações do Poder Judiciário. Tem como idéia básica a sua passagem de um poder meramente jurídico – visão liberal – para um poder político, que desenvolve importantes atividades de equilíbrio estatal e passa a ser considerado uma das instituições mais decisivas, tanto para quem se preocupa com o Poder visto de cima para baixo quanto para quem o olha de baixo para cima.<br />Teremos como alvo de análise nao só o Poder Judiciário em sentido amplo, mas principalmente o orgão que mais se aproxima da Política – pela sua própria natureza e importância -, a Corte Constitucional.<br />O Poder Judiciário começa a sofrer sensíveis alterações em um certo período da modernidade. Principalmente entre os séculos XVIII e XIX, quando ocorre a derrubada dos Estados Absolutistas e o recíproco reconhecimento de autonomia da Justiça como função estatal.<br />A formação dos Estados liberais tem dois modelos paradigmáticos que nos servirão de referência: o que nasceu da revolução americana de 1787 e o Estado fruto da revolução francesa de 1789. Mesmo que ambas as revoluções tenham levantado bandeiras politicamente liberais, elas deram lugar a dois modelos constitucionais essencialmente distintos entre si, o que gerou uma distinção entre o Judiciário americano e aquele previsto na França pós-revolucionária.<br />De forma sintética podemos dizer que no caso americano, revolução mais liberal que republicana, o Judiciário ganhou o status de poder político. Já no caso francês, o Judiciário era visto na sua função comum de justiça. A França, usou a plataforma liberal como forma de derrubar as monarquias absolutistas que usurpavam o país há tempos, enfraquecendo o Poder Executivo e fortalecendo o Legislativo – visto como o principal representante da soberania popular.<br />Já os EUA pareciam ter uma lúcida consciência de que governos populares também podem se mostrar despóticos e estavam, sim, sujeitos ao arbítrio. Qual a consequência disso? A Constituição americana, ao contrário da francesa, não afirmou a supremacia do Parlamento, e consciente que este Poder não poderia ficar imune a controles, seria necessário uma forma de limitar seu poder político. Vale lembrar também que na França havia uma particularidade: a desconfiança nos magistrados, principalmente naqueles do Antigo Regime, que eram vistos como representantes da nobreza e da aristocracia conservadora.<br />O Poder politico concedido ao Judiciário, principalmente nos EUA, era deflagrado principalmente com o mecanismo do controle de constitucionalidade das leis, conhecido propriamente como judicial review, pois “coloca o Judiciário em pé de igualdade com os demais poderes, exatamente naquela dimensão mais importante do sistema político: o processo decisório de estabelecimento de normas...”.<br />Quem bem destaca as diferenças entre o modelo de democracia liberal americano e francês é Tocqueville. Grande admirador da democracia americana, declara que “o mais poderoso e único contrapeso da democracia” é o Judiciário americano, principalmente se referindo à sua capacidade de controlar a constitucionalidade das leis aprovadas pela maioria política. Para Tocqueville, o Judiciário americano funcionava como um necessário obstáculo à maioria, limitando seu poder de forma à realizar os ideais da Constituição – ideais estes que não representavam uma maioria, mas toda a sociedade. O Judiciário, independente e repleto de privilégios, era a Nova Aristocracia, um poder necessário para frear as paixões democráticas.<br /><br />II<br /><br />Passamos do século XIX e vamos agora para o século XX. Este, será de extrema importância para a Politização do Judiciário, que ganhará contornos ainda mais acentuados.<br />O mecanismo de controle de constitucionalidade das leis começa a ser expandido para todos os Estados, e a nação norte-americana continuará a ser exemplo, principalmente através de sua Suprema Corte, de demonstração de Poder Judiciário como Poder Político.<br />Podemos dar dois exemplos americanos para melhor ilustrar o papel político do Judiciário. A Suprema Corte desempenhou importante papel no processo de implementação do chamado New Deal, projeto de recuperação econômica planejada pelo então presidente Franklin Roosevelt, elaborado após a Grande Depressão de 29. Contra o plano econômico, a Suprema Corte anulou vários dispositivos legais que visavam implementar o New Deal que já haviam passado pelo Congresso. Roosevelt se viu sem chances de ter seu plano aprovado. Propôs, então, ao Congresso, que ampliasse o número de ministros da Corte para quinze, aos invés de apenas nove, pois nomeando mais seis nomes ele poderia ter a maioria e, finalmente, não ter sua política ecônomica anulada pela Suprema Corte. Mas tal não foi preciso. Dois juízes alteraram seus votos e confirmaram a validade constitucional da legislação do New Deal, numa mudança que ficou conhecida como “the switch in time that saved nine”.<br />Outro exemplo emblemático encontramos no grande papel que exerceu o Judiciário americano na defesa dos direitos civis – já sobre a presidência, na Corte, de Earl Warren. O julgamento Brown versus Junta da Educação foi um dos principais, onde o Judiciário condenou escolas que praticavam a segregação racial. Poderiamos dar, aqui, vários outros exemplos, mas todos para confirmar uma idéia: o ativismo judicial. Claro que as críticas não demoraram para vir, a maioria dispondo que esse ativismo judicial gerava um “governo de juízes”, principalmente no que dizia respeito ao orgão que tem a última palavra sobre o Direito – a Corte Constitucional.<br />Na Europa muita coisa mudou. O modelo francês, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, parecia profundamente abalado, e vários países começaram a admitir o controle de constitucionalidade das leis. Importante destacar o papel da Constituição austríaca, sob influência do insígne Hans Kelsen.<br />No Brasil, o controle se encontra desde a Constituição de 1891. A Carta de 1988, porém, gerou um grande aumento no uso deste mecanismo. Seu grande número de legitimados causou um grande aumento de ações. Isso sem contar que nosso país adota o sistema híbrido de controle de constitucionalidade: o difuso e o concentrado no STF.<br />Na nossa opinião, uma das grandes utilidade do controle das leis é a realização da Constituição e o fato de ser um dos principais recursos das minorias políticas representativas, contra a maioria. Taylor, analisando nosso Judiciário, diz que ele representa um importante veto point no sistema institucional. Vale lembrar que o controle também confere correção e legitimação às decisões governamentais.<br /><br />III<br /><br />O Estado Social muito contribuiu, também, para a expansão do Judiciário e seu papel político. O Poder Jurisdicional, não pretende apenas atender à perspectiva liberal de Justiça, mas também visa a promoção da igualdade.<br />O grande Estado interventor na sociedade, que visa não apenas a conservá-la, mas sim a tranformá-la, provoca profundas mudanças na atuação judicial. O Judiciário passa também a ser a arena ideal para promover a defesa dos direitos novos: os direitos difusos e coletivos. E visando proteger os ideais constitucionais, surge o controle das políticas públicas pelo próprio Judiciário. Assim, o fenômeno atual da judicialização da política ou politização da justiça ganha força.<br />A crise que atinge o Estado do Bem Estar não reduz o papel da Justiça, muito pelo contrário, o Judiciário passa a ser visto como o único orgão que pode atender às demandas da sociedade civil. Grande demanda esta, combinada com a baixa capacidade do Judiciário.<br />A legislação social muito contribuiu para a expansão da Justiça – principalmente no caso brasileiro. A criação dos novos direitos já citados, as novas normas processuais – que colocam a Justiça ao alcance de atores coletivos da sociedade -, a Ação Civil Pública, as inúmeras atricuições do Ministério Público etc. Todos estes fatores, que procuram realizar os valores do Estado Social trazem grandes consequências ao Judiciário.<br />A judicialização da política é fenômenos inevitável, fruto de muitos outros, tais como a forte presença da democracia, o surgimento de grupos coletivos que visam ter seus interesses protegidos, uma política de defesa de direitos, atribuição de competência de defesa desses direitos e criação de instituições, tais como o Ministério Público, que representam e defendem os interesses da sociedade civil.<br />A polêmica em torno do Judiciário é ainda mais ampla devido à contraditoriedade de suas funções na democracia contemporânea: frear o poder das maiorias em nome das liberdades individuais, promover a igualdade de grupos por meio do acesso à Justiça e garantir a segurança jurídica das relações econômicas e do funcionamento do mercado.<br /><br />IV<br /><br />O grande papel do Judiciário também deve ser analisado como uma consequência da valorização contemporânea da Constituição. O surgimento da chamada Constitucionalização do Estado, que a nosso ver acarretará um Estado Judicial de Direito.<br />O Estado de Direito, surgido na era liberal, assenta-se sobre o monopólio estatal da produção jurídica e sobre o princípio da legalidade. É o chamado Estado Legislativo de Direito. A jurisprudência, neste Estado, não desempenha a função de produção de Direito, mas apenas seu conhecimento.<br />Após a Segunda Guerra Mundial, desenvolve-se o Estado Constitucional de Direito, e tem como característica central a subordinação da legalidade a uma Constituição rígida. Não basta apenas à lei respeitar uma determinada forma, deve também ter compatibilidade de conteúdo com as normas constitucionais. Aqui, a jurisprudência passa a desempenhar tarefas, invalidadando leis e interpretando de forma criativa as normas jurídicas à luz da Constituição.<br />A natureza da função do Judiciário, e principalmente da Corte Constitucional passa a ser vista como predominantemente política. E surge o problema de legitimidade democrática daqueles que decidem, em ultima instância, sobre a aplicação do Direito, pois não são eleitos pelos cidadãos. Acreditamos que é bom que seja assim, pois “idealmente preservado das paixões políticas, ao juiz cabe decidir com imparcialidade, baseado na Constituição e nas leis”. Porém, nem por isso não deixa de ser um poder representativo e democrático, devendo ser transparente.<br />Os problemas de ter o Judiciário com tantas funções é agravado, segundo Barroso, pelo texto prolixo da Constituição, a disfuncionalidade do Judiciário e a crise de legitimidade que envolve o Executivo e o Legislativo.<br /><br />V<br /><br />Iremos analisar agora um possível Estado Judicial de Direito, ou seja, um governo de juízes. É uma decorrência lógica que, com o surgimento do Estado Constitucional de Direito, o verdadeiro intérprete da Constituição passe a ter amplos poderes, algo evidente nos dias de hoje, principalmente em nosso país.<br />O problema começa já pela própria característica da norma constitucional. A Constituição possui, conforme Hesse e Haberle, uma textura aberta, ou seja, possuem pouca densidade normativa, dando ensejo a divergentes interpretações e com um diminuto grau de concretude. Daí surge a necessidade de instituir um orgão de seja o Guarda da Constituição e seu verdadeiro intérprete. Radbruch já dispunha que se ninguém pode dizer o que é justo, é preciso que algém defina pelo menos o que é jurídico. E a quem caberá esta competência? Impossível não lembrar, aqui, de Alexander Hamilton em O Federal:<br />“A interpretação das leis é própria e peculiarmente da incumbência dos tribunais. Uma Constituição é, de fato, uma Lei Fundamental e assim deve ser considerada pelos juízes. A eles pertence, portanto, determinar seu significado, assim como o de qualquer lei que provenha do corpo legislativo”.<br />À Corte Constitucional é atribúido grande responsabilidade: a responsabilidade de atribuir o signifcado verdadeiro ao texto da Magna Carta. O debate é mais profundo, a pergunta é o que é a lei? É o texto escrito? Não. A lei é o resultado da interpretação do texto. Assim a Constituição não é o texto escrito, mas aquilo que a Corte Constitucional diz que ela é. Adotamos aqui a concepção de Constituição dada por Peter Haberle, que vê a Constituição como “uma lei necessária mas fragmentária, indeterminada e carecida de interpretação à luz da publicidade”.<br />Todos os Poderes Públicos estão atrelados à Constituição, e ao Tribunal Constitucional está a responsabilidade de sua concretização. Por isso seu papel eminentemente político e o surgimento de um Estado Judicial de Direito. A Constituição é o resultado da interpretação judicial. As palavras de Alexander Pekelis reforçam isso: “ As grande cláusulas da Constituição americana, assim como as disposições mais importantes das nossas leis fundamentais, não contêm senão um apelo à honestidade e à prudência daqueles a quem é confiada a responsabiilidade da sua aplicação.<br />A meu ver, o problema principal ainda é o déficit de legitimidade democrática inerente ao monopólio judiciarista de interpretação autêntica da Constituição. O problema pode ser resolvido à luz da teoria de Haberle de que uma sociedade aberta e pluralista exige também uma interpretação aberta de sua Lei Maior, abrindo a sociedade dos intérpretes da Constituição, estimulando o diálogo jurídico e político entre os interpretadores oficiais – Corte Constitucional – e os vários segmentos da sociedade.<br />“Se vivemos num Estado de Direito, torna-se imperioso que a leitura da sua Constituição seja feita em voz alta e à luz do dia, no âmbito de um processo verdadeiramente público e republicano, num diálogo jurídico do qual participem os diversos atores sociais – agentes políticos ou não -, porque, afinal, todos os membros da sociedade, e não apenas os dirigentes, fundamentam na Constituição os seus direitos e obrigações.R. Bisellihttp://www.blogger.com/profile/12507304467117974588noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2061185378959749391.post-8683284524109582712008-11-09T12:22:00.002-08:002008-11-09T12:35:07.746-08:00Crise do Estado ContemporâneoO objetivo do presente ensaio é analisar a crise que atinge o Estado atual, crise esta que não possui apenas uma faceta, mas várias. São crises que se interpenetram e que, conjugadas, provocam a queda e o questionamento de vários dogmas do pensamento político da modernidade. Assim, através de um método analítico, chegaremos à conclusão que é preciso repensar o fenômeno político da contemporaneidade.<br />Como primeiro ponto, iremos analisar o elemento que sempre foi usado como conditio sine qua non do Estado Moderno: a soberania. O conceito de soberania surgiu praticamente nos anos 1500, e foi primeiramente teorizada por Jean Bodin, em sua obra Lês Six Livres de la Republique. A soberania traduz a idéia essencial do Estado moderno, ou seja, a monopolização do poder por parte de um rei, onde passa a inexistir a concorrência entre poderes distintos. No momento em que surge, na monarquia absolutista, a soberania é vista como o poder absoluto e perpétuo, sofrendo limitações apenas divinas e naturais.<br />Desde então, o conceito de soberania passará por várias transformações. Com Rousseau, a soberania passa das mãos do monarca para as mãos do povo. E depois, o Estado, visto como pessoa jurídica, que deterá a titularidade da mesma. Nas tradicionais aulas de Teoria Geral do Estado, vimos que a soberania é o poder juridicamente incontrastável, que possui a capacidade de definir e decidir acerca do conteúdo e aplicação do Direito, impondo-as de forma coercitiva em um determinado território – nos dias atuais, nada mais ilusório.<br />Nas ultimas décadas é evidente o questionamento do conceito tradicional de soberania. Podemos ver facilmente, para começar a análise crítica, a formação de outros centros de poder, concorrentes com o próprio Estado, que operam nos campos político, econômico, cultural e religioso. Assim, alguns atores sociais passam a desempenhar funções que seriam tradicionalmente públicas. Um exemplo são os sindicatos e as organizações empresariais que patrocinam determinadas atividades e tomam decisões que deveriam ser incluídas no rol de atividades da maquina estatal.<br />Como segundo ponto, é impossível não lembrar do fenômeno mais debatido pelos intelectuais no século atual: a globalização. Algo que decorre diretamente da globalização e, a meu ver, senão destrói, no mínimo questiona a soberania, é o fenômeno das Organizações Internacionais. Devido a isso, os Estados passam a não ser mais independentes entre si e sem a velha capacidade de autodeterminação. A cooperação jurídica, econômica e social entre os países afeta de maneira frontal a autonomia estatal de cada um.<br />Ainda dentro do fenômeno da globalização, principalmente a econômica, é transparente também o papel que as multinacionais desempenham. Por serem de demasiada importância para alguns Estados – principalmente os de terceiro mundo -, esses atores econômicos passam a ter capacidade de decisão e influência que muitas vezes fogem ao controle do Estado, que se vê à mercê deles. Surge assim um fenômeno importante mas ainda duvidoso: a supremacia do econômico sobre o político.<br />E o que dizer, então, das grandes Organizações Internacionais financeiras, tais como o FMI? Nos é bem familiar a influência que esta organização pode ter no planejamento político, econômico e social de um país. O Estado Brasileiro muito perdeu de sua autonomia e governabilidade devido à dependência com o FMI, relação gerada pela nossa grande dívida externa.<br /><br />Outro elemento que abala a soberania é a questão dos direitos humanos, surgida no pós Segunda Guerra Mundial. A dificuldade na relação direitos humanos x soberania está na própria natureza jurídica daqueles direitos, vistos como direitos universais. Assim, falando em termos mais corretos, a questão frontal à soberania é a internacionalização dos direitos humanos. A concretização dos direitos humanos passa a ser tarefa de todos – de todos os Estados –, um comprometimento com a dignidade comum. É aí então que mora o problema, pois com a criação de Jurisdições Internacionais, os Estados passam a perder sua autodeterminação em prol da eficácia dos Direitos Humanos. Mais um elemento necessário para se repensar o problema da soberania.<br /><br />II<br /><br />Partiremos agora para outra crise, a crise de um modelo de Estado, mais propriamente a crise do Estado Social. A faceta mais relevante dessa crise é sem dúvida a crise financeira e econômica deste modelo. O processo de intervenção do Estado na economia e na sociedade civil – que causou um grande crescimento da máquina estatal – não beneficiou apenas as classes trabalhadoras, pois através de atuações em muitos setores, por meio de grandes investimentos, também alavancou o processo da industria. O aumento nos gastos públicos, obviamente causaram um déficit nos cofres. Tudo fruto do processo de ampliação do Estado, atuando em todos os segmentos da sociedade, totalmente contraposto ao Estado-Mínimo dos liberais.<br />Mas, será possível retornar ao Estado-Mínimo? Os neoliberais acreditam que sim. Aliás, foi essa a idéia do Consenso de Washington, perceptível nos governos Thatcher e Reagan, pretendendo diminuir a ação estatal, principalmente sobre o sistema econômico. Porém, e os últimos acontecimentos mundiais? Esta profunda globalização econômica e a grande ligação entre os sistemas econômicos e financeiros – uma crise num Estado atinge o mundo inteiro – poderia ser combinada com um mercado livre? O que seria da economia hoje sem os pacotes bilionários dos governos mundiais? E a eleição do democrata Obama à Casa Branca? Havíamos dito, e muitos autores também o fazem, que o econômico esta prevalecendo e ditando as regras do jogo político, mas e sobre as esperanças depositadas no governo Barack Obama para resolver a crise mundial? Será que o econômico é tão independente assim do político? Será possível a volta a um Estado que já se mostrou insuficiente, como quer por exemplo Friedrich Hayek, o pai do neoliberalismo? A meu ver o Estado Social já se esgotou, porém um retorno ao Estado de moldes do Liberal parece impossível, e os acontecimentos dos últimos meses nos demonstram isso.<br /><br />Outra crise inerente ao Estado Social é a crise funcional. Por admitir várias funções, este Estado parece não conseguir desempenhar nenhuma com eficácia. O ampliamento do Estado parece tê-lo tornado uma gigante maquina burocrática que não anda devido a entraves formais e materiais. Outro acontecimento paralelo é o crescimento da demanda da sociedade civil, o que obsta ainda mais as funções do poder. Quais as conseqüências? A falta de governabilidade do Estado, pois passa a não conseguir finalidades puramente públicas e assim a sociedade é que passa ela mesma a se apoderar de tais finalidades – basta observar o fenômeno das privatizações. Outra conseqüência, é sem dúvida o déficit de legitimidade do Poder Político,<br />A representação política também não escapa da crise do Estado Social. Os órgão representativos do Estado, principalmente o Parlamento passa a perder legitimidade por não responder às necessidades do povo, se movendo muitas vezes por interesses econômicos e não políticos. As conseqüências sobre a democracia são graves: a apatia política, pois para os indivíduos todos os atores políticos se tornam “farinha do mesmo saco” e a sociedade não deposita sua confiança nos governantes. Surgem também, os grupos de pressão, que por influência pretendem ver atendidos seus interesses particulares através do lobby sobre os representantes.<br />Isso sem falar no controle que tem o poder e a mídia sobre a opinião pública, direcionando-a como bem entender. Diante de tudo isso se pergunta: onde está o bem comum? Parece ser mais um dogma do Estado Moderno que não caracteriza mais o Poder Político. Nosso grande professor Celso Campilongo, devido a tudo isso, a crise da representação política, afirma que parece haver um gap entre o sistema político e o sistema social. Sistema social este cada vez mais complexo e mais difícil de atender.<br /><br />III<br /><br />O Direito também é profundamente abalado por essas novas realidades. Sua racionalidade vinda do Estado Liberal se mostra muitas vezes incapaz de cumprir sua funções tradicionais, tais como controle e promoção da sociedade. Passa a transferir cada vez mais para a sociedade a capacidade de impor suas próprias regras do jogo. E caem também, muitos paradigmas do Direito, paradigmas que até hoje são os ensinados nas Faculdades de Direito.<br /> Assim, é preciso repensar o Estado Contemporâneo. Repensar e refletir em um modo de atender à sociedade do modo que o Estado deve atender, para que não perca sua justificativa de obediência e não passe a ser apenas um elemento do todo social. O Estado sempre foi a instituição mais importante e necessária para uma sociedade que caminha para a igualdade e a liberdade. O velho lema Justiça e Liberdade nunca poderá ser alcançado sem ele e este é um dogma que a meu ver nuncá será derrubadoR. Bisellihttp://www.blogger.com/profile/12507304467117974588noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2061185378959749391.post-1157712604658664972008-10-24T22:40:00.006-07:002008-11-07T10:10:09.911-08:00O Problema da TolerânciaA questão da tolerância se apresenta, e sempre se apresentou, muito ampla e complexa, compreendendo várias questões – convivência de minorias étnicas, lingüísticas, raciais, homossexuais, loucos e deficientes. Neste ensaio, pretendemos analisar apenas dois problemas, considerados principais devido à sua relevância no Direito Constitucional contemporâneo: a tolerância religiosa e a tolerância política. No final do ensaio, pretende-se colocar um problema diante de ensinamentos de Herbert Marcuse, tocante ao tema “A Tolerância Repressiva”.<br />A concepção de tolerância é simples, e começa a ser difundida a partir da Reforma Protestante, promovida principalmente por Martinho Lutero, e que deu início ao Estado Moderno propriamente dito. Aqui, é impossível não nos remetermos a Max Weber, que melhor compreendeu o espírito e a formação deste Estado que colocou fim ao Antigo Regime. Weber, em “Economia e Sociedade”, deixa claro o surgimento do politeísmo de valores, ou seja, com a derrubada da Igreja, que na Idade Média assumia não só o poder espiritual mas também o poder terreno, surgem as várias concepções daquilo que é certo ou errado, justo ou injusto, legítimo ou ilegítimo etc. A Igreja não tinha mais o monopólio do saber. Com isso, os indivíduos passam a ter a sua própria concepção dos valores, o que faz com que estes se tornem valores relativos a cada pessoa, em cada lugar, em cada tempo histórico. É impossível, então, falar da existência de um valor absoluto e objetivo.<br />Eis que surge o problema da tolerância, da própria necessidade histórica do Estado Moderno. Passa a ganhar contexto a preocupação sobre a existência e coexistência entre os diferentes, entre os vários valores, e a aceitação de que é possível ter, dentro de uma sociedade, concepções e valores diversos. De modo simples, surge a pluralização de valores. Surgem questões como: é a tolerância necessária ao bem da sociedade? Ou a intolerância que é necessária para evitar o combate entre indivíduos da sociedade e mesmo evitar que um indivíduo destrua toda a coletividade? Qual a relação que deve ter o tolerante em relação aos outros? Como lidar com os intolerantes numa sociedade que majoritariamente vê a tolerância como um valor que deve ser respeitado? A questão não é simples, mas sim impossível de ser esgotada. Pretendemos apenas problematizar a questão, em um ambiente atual em que o pluralismo de valores funciona como um dos fundamentos daquele que acreditamos ser hoje o melhor regime de governo: a democracia.<br />Bobbio, ao escrever sobre as razões da tolerância, as divide em más razões e boas razões. A tolerância, e começamos aqui pela má razão, é acusada pelos intolerantes como um indiferentismo, caracterizando os tolerantes como pessoas céticas, que não possuem convicções firmes e não reconhecem uma verdade que possa ser defendida. Já os próprios tolerantes acusam os intolerantes de fanáticos, que acreditam que a verdade corresponde apenas a seu pensamento, sem se preocupar com as verdades dos outros indivíduos.<br />O tolerante, e agora uma das boas razões, defende o direito de cada indivíduo de defender a sua própria verdade, não se mostrando, portando, contra a verdade. O que diferencia um modo do outro é o método para se chegar à verdade. O tolerante, respeitoso a todas as concepções de vida, acredita que a melhor forma de se atingir a verdade é através do conhecimento de todas as convicções e a partir do debate e da persuasão encontrar uma verdade. Já o intolerante, pretende como método não considerar as outras concepções, fazendo a sua verdade prevalecer mediante o uso da força e da violência. Aqui, é adequado palavras de John Locke, o grande teorista do Estado Liberal e da Tolerância: “A verdade não necessita da violência para encontrar audiência no espírito dos homens e pode ser ensinada por meio da lei. Os erros é que reinam por meio de ajuda externas. Mas a verdade, quando não pode lograr o entendimento mediante sua própria luz, não pode consegui-lo tampouco mediante a forca de terceiros”.<br />Outro argumento a favor da tolerância é de tipo moral: o simples respeito aos outros. Assim, o tolerante não é indiferente à verdade, mas sim um indivíduo consciente dos direitos de todos. A verdade possui várias caras, e sua forma absoluta pode ser atingida através da comparação e da síntese – aqui entra a dialética como um relevante método do conhecimento – de todas as “verdades parciais”.<br />Porém, a tolerância tem também um sentido negativo, o que dá forças à intolerância. A tolerância, no seu mal uso, pode ocasionar o aparecimento de erros e maldades graves, sem que essas sejam punidas e rejeitadas, pelo simples fato de serem toleradas. Assim, entra o sentido positivo da intolerância como rigor e pulso firme, necessário para combater a própria natureza humana de incorrer no erro. Importante, mais uma vez, lembrar de Locke, de uma particularidade de seu pensamento acerca da tolerância. Locke, só admitia a intolerância em um caso: a intolerância frente aos ateus, pelo simples fato de que estes não seriam capazes de obedecer a nada, nem a um juramento, não sendo cidadãos confiáveis: "Para um ateu, nem a palavra dada, nem os pactos, nem os juramentos, que são os vínculos da sociedade humana, podem ser estáveis ou sagrados; ao eliminar Deus, mesmo só em pensamento, derrubam-se todas essas coisas".<br /><br /><strong>II</strong><br /><br />Vamos agora ao pensamento de Marcuse e a Tolerância Repressiva. De forma simples, Marcuse professava que existe a tolerância má e a boa. A boa seria aquela que permitisse as idéias progressivas e rechaçava as reacionárias. Já a má, permitiria tudo, caindo no erro do excesso de tolerância. Bobbio contrapõe Marcuse na pergunta: quem distingue as idéias boas das más? Qual seria o critério usado? Além de que, Tolerância Repressiva é uma contradição de termos, pois a tolerância só existe quando se toleram também idéias más.<br />Mas é inegável que Marcuse nos deixa uma sábia lição: a tolerância não pode ser ilimitada. E qual os limites da tolerância? A própria intolerância! Os tolerantes só não podem tolerar aqueles que não respeitam os princípios da coexistência: o intolerante. Portanto, o tolerante pode tolerar tudo, menos a intolerância.<br /><br /><strong>III</strong><br /><strong></strong><br />Saindo agora do campo da zetética, e entrando na esfera da dogmática jurídica, podemos, com total segurança, afirmar: a tolerância é considerada princípio válido e absorvido em todas as Constituições democráticas de nossos tempos. Particularmente na nossa, onde estão reconhecidas a liberdade de consciência e a liberdade de religião, com o nosso Estado se constituindo em um Estado Laico. Vale lembrar, ainda, que um dos fundamentos de nosso Estado de Direito é o princípio do pluralismo político.<br />Termino este ensaio, ressaltando a importância da tolerância para a consecução da democracia. E farei isto deixando aqui um conceito de democracia, dado por Bobbio, o qual consideramos um dos melhores já relatados: “É a forma de governo na qual valem normas gerais, chamadas leis fundamentais, que permitem aos membros de uma sociedade, mesmo que sejam numerosos, <em>resolver os conflitos que inevitavelmente nascem entre grupos que defendem valores e interesses diferentes, sem necessidade de recorrer à violência</em>" (grifo nosso).<br />Já é sem dúvida, como conclusão, a relação entre a tolerância e a democracia. Uma não pode existir sem a outra; onde uma não se encontra, é impossível à outra se realizar plenamente. Indagar sobre a tolerância é questionar a própria legitimidade da democracia como regime ideal de governo. Ao olharmos para não tão longe na história, é facil notar que os Estados menos democráticos se caracterizaram como os Estados mais intolerantes da humanidade - nazismo e fascismo -, que até hoje são defendidos através de argumentos utilitários. Esta é, sem sombra de dúvidas, uma das perguntas mais complexas e infindáveis de toda a história, que persiste desde Platão até Hegel, de Tocqueville a Rawls e Habermas: é a democracia a melhor forma de governo?R. Bisellihttp://www.blogger.com/profile/12507304467117974588noreply@blogger.com